- Tá com sono?
- Não.
- Nem eu.
- Quando se fica uma noite sem dormir os olhos ficam pretos?
- Acho que não. Podem ficar vermelhos ou profundos ao redor deles.
- Tô com sono.
- Como assim? Como você conseguiu chamar o sono?
- É assim: você fica muito tempo com os olhos abertos que o sono vem.
- Vou tentar...
- Conseguiu?
- Ainda não. E você?
- Não.
- Esse seu jeito de pegar no sono não está funcionando muito...
- Quando chove não sei por que os colchões ficam macios... Quando eu ia pra creche a tia botava todo mundo pra dormir juntos em vários colchões. Quando chovia a gente dormia a tarde toda, mas quando não chovia a gente brincava escondido na hora que tinha que dormir. Era só ela sair que a gente começava a brincar. Ela via aquela bagunça e brigava e botava a gente pra dormir de novo, mas era só ela sair começava tudo de novo. Quando eu brinco o sono vai embora... Eu acho que esse sono também não está com sono.
- Chama ele pra gente dormir.
- Sono cadê você?... Na escola a gente chama os lápis desaparecidos. Todo mundo fica posição de cachorrinho no chão procurando e chamando ele, assim: Lápis, a gente vai fechar os e você aparece, e ele aparece.
- Mas porque tem que ficar na posição de cachorrinho?
- Ué, porque tem que olhar debaixo das carteiras, mesas e nos dos pés dos coleguinhas. Tem que ser posição de cachorrinho mesmo.
- Hum, entendi... A gente precisa dormir...
- Meus olhos estão ficando pretos... Dormiu?
- Não...
- Quando você dormir você me fala?
- Falo.
- Mas se eu e você dormir como a gente vai avisar uma pra outra que dormiu?
- Então, quem dormir por último vai saber a resposta.
- Mas e se a duas dormirem ao mesmo tempo?
- Ai, eu não sei. Então, só dorme...
De manhã quando eu acordei, ela tinha ido pra minha cama, estava abraçada nas minhas pernas. Dormiu comigo e nem vi quando ela mudou de cama. Eu devo ter pegado no sono primeiro.