Por Mariana Guimarães
A criatividade de Cibelle não tem limites. A artista plástica, cantora,
compositora e produtora achou no leste de Londres o seu lugar. Sob o codinome
Sonja, ela nos recebeu para uma balada pós fim do mundo em seu Las Vênus Resort
Palace Hotel. Entre e relaxe.
Cibelle Cavalli espera
a Mixmag no Dalston Superstore, um bar com uma
proposta artística forte que atrai alternativos de toda Londres. Como na capa de seu
novo disco, seus cabelos escuros e cacheados estão emoldurados por uma franja
de borda cor-de-rosa que “primeiro tava muito fúcsia, agora é que ficou da cor
que eu queria.” De vestido preto com longas franjas azuis e casaco verde
comprado num brechó de Paris, seu colorido contrasta com as paredes cinza de
concreto do lugar. Ela conta que passa tanto tempo ali, que é como se fosse sua
segunda casa. “Eu gosto de lugar gls, geralmente é mais relax, sem frescuras,
todo mundo fica à vontade.”
Apesar
de estar se curando de uma gripe, a voz e a personalidade de Cibelle são tão
envolventes quanto sua música. É fácil entrar no clima e a conversa flui solta,
passando por suas mudanças e experiências até sua filosofia artística.
Nascida
em São Paulo em 1978, dos seis aos 13 anos estudou música clássica no
Conservatório Tupinambá. Tocava um pouco de piano, mas percussão era o que mais
gostava. “Hoje eu toco de tudo”. Quem esteve no SESC Vila Mariana no ano
passado, em que fez um show inteiro sozinha, sabe bem. “Não acho legal essa
coisa de diva. Como eu sei tocar, gosto de ir pra frente e fazer.“
ARTE PELA ARTE
Cibelle
conta que foi só dos 17 pra 18 anos que descobriu os clássicos da música
popular brasileira. “Eu comecei cantando nuns botequinhos em Pinheiros. Mas eu
sempre preciso mudar, eu não consigo fazer as coisas do mesmo jeito muitas
vezes. E eu dizia: vamos tocar diferente? E as pessoas diziam: não, mas a
música é assim.”
Foi
aí que conheceu o músico yuguslavo Suba e sua carreira deu uma virada. Se
apaixonou pelos beats eletrônicos misturados com samba e gravou com ele São
Paulo Confessions. Tragicamente, ele morreu logo antes do lançamento. “O Suba
era incrível, parecia que ele vinha da mesma ilha espacial que eu. Tipo pode
tudo, se você sentir. Aprendi com ele que a arte é uma sementinha que você joga
pela janela e não tem como saber o que vai acontecer com ela. Você tem que
estar feliz de verdade, porque você vai viver com isso pra sempre.”
A
partir daí continuou seu percurso com a gravadora belga Crammed e foi ganhar o
mundo. “Eu me senti insegura, mas vi ali que as coisas acontecem porque você
consegue. Eu via o que acontecia no Brasil e pensei: fui!”
Ela
se mudou pra Londres em 2003 e foi morar na Brick Lane, a rua de imigrantes
muçulmanos que era o coração artístico e alternativo do East End londrino na
época.
SONJA KHALECALLON
A trajetória de Cibelle parece
sempre marcada por grandes acasos, parcerias e transições que ela vai
incorporando em sua arte. Outra grande influência foi através do amigo Rick
Castro, artista plástico americano percursor do movimento abravana. Pergunto o
que é, afinal, abravanar?
“Abravanar é você let go, você tá preso num lance e você faz alguma coisa pra explodir isso, expandir sua energia. Cada pessoa faz isso de um jeito: o lance do Rick é explodir em cor, é sair na rua chocando as pessoas com barulho, cor e felicidade. Minha maneira foi mudar pra cá, eu forço as coisas, tudo comigo.”
“Abravanar é você let go, você tá preso num lance e você faz alguma coisa pra explodir isso, expandir sua energia. Cada pessoa faz isso de um jeito: o lance do Rick é explodir em cor, é sair na rua chocando as pessoas com barulho, cor e felicidade. Minha maneira foi mudar pra cá, eu forço as coisas, tudo comigo.”
Foi
num desses encontros com Rick que nasceu o codinome Sonja Khalecallon, uma
espécie de alter-ego camaleônico de Cibelle. Ela faz instalações e performances
como Sonja, e mostra as fotos que carrega no celular. Em uma delas, vestida à
moda antiga distribui objetos de suas memórias a quem quiser levar.
“Eu
gosto muito de questionar a identidade, eu trabalho muito com o desapego. E com
a imagem e som, trabalhar essa ideia de quem sou eu, quem é você. As primeiras
coisas de Sonja com imagem eram muitas fotos minhas, auto-retratos em gif. Essa
é a essência, é porque eu faço as coisas. Eu trabalho conversando com o
inconsciente e descobri, através da arte, a deixar sair pra depois olhar e
entender o que tá acontecendo”.
CAMINHANDO POR DALSTON
Resolvemos dar uma volta
pelo bairro e ir conhecer o estúdio. Dalston é uma área com gente de várias
etnias, que vem se tornando um reduto de artistas e pessoas alternativas. A
rua, os prédios, as lojas uma ao lado da outra formam um conjunto uniforme sem
estética. Algumas fachadas parecem espaços abandonados, mas “cada uma dessas
portinhas são bares e baladas”, revela enquanto posa para fotos em frente às
vitrines.
Ela conta que é fã dos mercados e brechós da área, onde acha muito do que usa. “Ninguém tá ligando muito na rua aqui. Eu adoro a zona toda. É parecido com o que tinha em Brick Lane, mas mais vibrante. Menos véu, menos machista. É muito mais quente, tem uma mulherada jamaicana, mais alegre, sem frescura.”
Foi há dois anos que surgiu a oportunidade de vir pra Dalston dividir a casa e o estúdio com outros cinco artistas, a Supine Studios. Quando chegamos, ela vai nos mostrando e explicando o que rola ali. No térreo, os dois ateliers têm de tudo, desde um piano até muito material de carpintaria, onde cada um tem seu espaço. Ela mostra a sua mesa, desenhos e fotografias. Aqui também acontecem shows de bandas e exibições. Em cima fica o resto da casa e o estúdio de som fica no andar de baixo, onde gravou parte do novo CD. Ela mostra o jardim que agora é coberto de madeira do flatmate Simon Ribchester, que participa na música The Gun and The Knife, “ grande violonista e guitarrista”. Também se rasga em elogios à banda com quem toca: Las Shark, “uma das mais criativas de Londres”.
Ela conta que é fã dos mercados e brechós da área, onde acha muito do que usa. “Ninguém tá ligando muito na rua aqui. Eu adoro a zona toda. É parecido com o que tinha em Brick Lane, mas mais vibrante. Menos véu, menos machista. É muito mais quente, tem uma mulherada jamaicana, mais alegre, sem frescura.”
Foi há dois anos que surgiu a oportunidade de vir pra Dalston dividir a casa e o estúdio com outros cinco artistas, a Supine Studios. Quando chegamos, ela vai nos mostrando e explicando o que rola ali. No térreo, os dois ateliers têm de tudo, desde um piano até muito material de carpintaria, onde cada um tem seu espaço. Ela mostra a sua mesa, desenhos e fotografias. Aqui também acontecem shows de bandas e exibições. Em cima fica o resto da casa e o estúdio de som fica no andar de baixo, onde gravou parte do novo CD. Ela mostra o jardim que agora é coberto de madeira do flatmate Simon Ribchester, que participa na música The Gun and The Knife, “ grande violonista e guitarrista”. Também se rasga em elogios à banda com quem toca: Las Shark, “uma das mais criativas de Londres”.
LAS VÊNUS RESORT PALACE HOTEL
“Dando
esse rolê por aqui, fui entendendo o quanto eu gosto de coisa feia, que as
pessoas acham feio – essa coisa do mau gosto, do brega, do vulgar. Aí eu
pensei, então, vamo lá, cansei de tentar caber! Eu não sou cool, eu sou
quente.”
Esse
é o clima do seu terceiro CD, a ser lançado no Brasil em breve, que Cibelle
produziu em parceria com o canadense Damian Taylor, engenheiro de som da Björk.
O som “punk tropical pós-apocalíptico” foi inspirado em Exótica, estilo musical
americano popular nos anos 60. “Um dia eu descobri que o som que eu mais gosto
é o que as pessoas chamam de Exótica. Eu gosto de coisa meio bizarrinha, que é
muito pessoal, mais divertido.”
No
conceito do disco, o mundo terminou, quem pôde foi embora explorar outros
planetas e a Terra decadente só sobrou aos miseráveis, artistas e boêmios. No
Las Vênus Resort Palace Hotel, Sonja é a hostess e faz de tudo para entreter
seus hóspedes. “Na minha visão, todo mundo já escapou, é positivo, é só continuação.
Vamos supor que a gente ficou galático. Da mesma forma que a gente gosta de bar
sujinho, vem fazer clubbing em Dalston quando tá trash, a mesma coisa vira o
planeta Terra, um lugar meio underground, meio zoado, para onde a galera que
quer se divertir vai.”
Cibelle
conta que esse é o disco com o qual ficou mais feliz. “Eu amo esse disco por
vários motivos. Todo mundo diz que ficou feliz, que o disco tá divertido. Eu
quero propagar uma energia de abravanação, a gente gasta muita energia tentando
caber nas coisas.“
A LOJA DA SONJA
Agora
na sua mente você vai entrar na loja do Hotel, vai adquirir o Cartão de Licensa
Poética. Com ele, você fala o que vc quiser. Por exemplo, se você quer escrever
uma letra em uma língua que não existe, não tem problema, se você inventou uma
palvara, também não tem problema, se usou 5 linguas diferentes, OK, se cantou
só em português, numa boa. Você tem licensa poética pra fazer o que quiser.
O
outro produto é o Colírio do Olho Fresco, que você pinga no seu olho e enxerga
o mundo sem bagagem emocional nem julgamento. Você olha e vê uma pessoa sem
pensar se a cor da blusa dela quer dizer isso ou aquilo.
Outro
a Loção Anti-cético, para você ver as coisas com mais encanto, com mais poesia,
mais diversão, mais leveza. Como uma criança.
O
último é o Abravana, ou botão do Foda-se (versão). Relaxa e aproveita.
Coisas
de Sonja, Sonja loves you, Sonja te ama!
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