Quando eu era criança
eu pensava muito na morte, principalmente, na morte da minha mãe. Tenho alguns
fleches dessa memória, eu no banho escovando os dentes, a água caindo na pia e
do nada eu pensava: “quero que minha mãe morra”!
Na época eu achava que
era coisa do demônio... me sentia tão mal por desejar algo tão fora do normal.
Eu queria morrer por pensar assim... com o tempo fui amenizando a culpabilidade
de tal sensação, pois mesmo rejeitando com todas as minhas forças o pensamento
de morte, ela aparecia silenciosamente, subitamente por mais que eu lutasse
contra. E quanto mais eu a rejeitava,
ela aparecia não importava a onde. No banheiro, no ônibus na volta para casa,
lendo um livro, rezando... comendo, antes de dormir... eu rezava muito, pedia pra
que deus tirasse aquilo de mim. Ele nunca fez isso...
Eu penso muito na
morte. Muitas vezes não penso no como, não crio cenários, só penso na afirmação
da morte de alguém. Tal pessoa irá morrer... e como um Deus todo poderoso eu
lanço o dilúvio...
Mas com o tempo comecei
a imaginar situações de morte. Um ônibus passando na ponte, ele cai. Eu tento
salvar as pessoas inutilmente e morro afogada. Eu andando pela rua, um carro
passa por cima de qualquer objeto, e esse objeto me atinge na cabeça. Sangro até a morte.
De uns tempos pra cá
comecei a aceitar de vez isso. Assumi com menos peso. Hoje penso que quando afirmo
a morte é porque quero é afirmar a vida. Penso no contrário pra enganar a
morte. Ai ela desvia seu percurso e desiste. Desiste de passar a mão em mim,
desiste de passar as mãos na minha mãe quando ela tentar se matar com os seus remédios.
Penso que dessa forma salvo minha mãe das suas tentativas afirmativas de
morte... e afinal a gente morre um tanto de vez por dia sem saber... não tenho
mais medo da morte, não tenho mais culpa.
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