Brasília é muito ampla. O que mais se escuta por aqui são os carros e os pássaros. Às vezes não se escuta nada, mas eu não aguento e tenho que tapar os ouvidos bem forte com os dedos. É um exagero, eu sei. Mas quando se fala de um espaço imenso, onde estão as pessoas?
Meus
olhos ficam a procura de pessoas coloridas: uma pessoa azul poderia facilmente
se confundir com esse céu enquanto voasse, uma amarela poderia muito bem estar
empoleirada nos galhos de um ipê, e com certeza eu não conseguiria distinguir uma
pessoa vermelha tirando um cochilo sobre a terra sangrenta do cerrado. Mas tem
o vasto concreto, onde ninguém pode se esconder.... De certo as pessoas estão
em suas vidas.
Existe
tanta sutileza no óbvio...
Num
amplo espaço de vazio, as árvores rompem o território de Brasília - existem
árvores, pássaros, carros e eu.
Entre
eu e a seca de setembro, avisto ao longe uma pessoa caminhando. Uma pessoa e o
espaço. Uma pessoa grão no espaço, ou do espaço.
Não
é preciso definir um grão de existência no infinito do existir. Apenas se é e
isso já é tudo. Me perdi e começo a sentir a cidade falando pelo corpo.
De
surpresa, o acaso desembrulha um leão caminhando na savana de setembro. Um
amigo leonino passa por trás de mim. Só percebi que era um amigo, porque olhei
movida pela curiosidade de saber quem habitava aquele espaço tão amplo. Uma
dimensão subjetiva da manhã, um sol rasgando o meu silêncio. Meu minuto de
silêncio interrompido.
Ele,
esguio e magro, passava pelo caminho dos desejos com sua juba invisível e
seguiu em frente. Nada disse e passou. Passante. Talvez ele não quisesse
interromper o meu espaço amplo. Naquele momento eu habitava um amplo espaço, eu
era um grão de existência debaixo da sombra de uma árvore do cerrado no mês da
seca. Ele era o passante a romper o vazio de Brasília.
Brasília
é espaçosa. Em todo canto as aranhas constroem condomínios de luxo. E o vento
que sopra entre seus fios, corre por Brasília com oito pernas de saudade em
direção ao mar. Aos mares. A mim. Ás vezes, eu mesma estou seca e o vento morre
na praia. Então eu passo a língua nos lábios e uma onda transforma esse corpo
de vento em som.
Tentei
assoviar para o leão, na tentativa de um contato direto, mas não surtiu efeito
direito. Não insisti e voltei para o encontro imediato com espaço. Espaço. Espaço.
Tão amplo e tão tempo... é essa a imagem que percorre meu dia a dia pela
cidade. Eu ando a pé para acalmar as ondas. Eu ando a pé para desbotar a minha
cor de concreto, pra alimentar outros desejos, pra descobrir novos caminhos.
As
pessoas existem nos espaços amplos de Brasília.
Brasília
é meu castigo.
Marcia e Roberto
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