sábado, 19 de maio de 2012

... e tempo para voltar para casa.


Eu,

Essa carta compõe uma serie de (mu)dança, um presente presente  que se defende ágil e tranqüilo a mim mesma. Sim, esta carta é para mim. Escolhi me dar o abraço que nunca me dei. Escolhi me ver além do muro, além do que posso ver e entender. Resolvi nesses meus vinte e poucos anos fudido me sentir inteira... Os seios, a barriga, o cabelo, a buceta, a boca, o corpo inteiro... Inteiramente me terei em abraços... Liberdade. Serei sim os abraços que sempre remediei em me dar.  Serei o sorriso finalmente largo que escondi atrás dos dentes rangentes. Serei a mulher que nunca me vi ser... Vestirei-me nua, toda nua a mim mesma. Só assim poderei me arriscar no mundo, quem sabe no outro. E só assim “um dia virá em mim à capacidade tão vermelha e afirmativa quanto clara e suave. Um dia o que eu fizer será cegamente, seguramente, inconscientemente visando em mim, na minha verdade, tão integralmente lançada no que fizer, que serei incapaz de falar. Sobretudo um dia virá, em que todo o meu movimento será criação, nascimento. Eu romperei  todos os não que existem dentro de mim, provarei a mim mesma que nada há a temer, que tudo que eu for será sempre onde haja uma mulher com o meu princípio. Erguerei dentro de mim o que sou. Um dia a um gesto meu minhas vagas se levantarão poderosas, água pura submergindo a dúvida, a consciência. Eu serei forte como a alma de um animal e quando eu falar serão palavras não pensadas e lentas, não levemente sentidas, não cheias de vontade e de humanidade, não o passado correndo o futuro. O que eu disser soará fatal e inteiro. Não haverá nenhum espaço dentro de mim para eu saber que existe o tempo, os homens, as dimensões. Não haverá nenhum espaço dentro de mim para notar sequer que estarei criando instante por instante, não instante por instante. Sempre fundido, porque então viverei, só então viverei maior do que na infância, serei brutal e mal feita como uma pedra, serei leve e vaga como o que se sente e não se entende. Me ultrapassarei em ondas. Ah, Deus. E tudo que cabe e venha sobre mim, até a incompreensão de mim mesma em certos momentos brancos. Porque basta me cumprir. E então, nada impedirá meu caminho até a morte sem medo de qualquer luta ou descaso, me levantarei, forte e bela, como um cavalo novo.” E então, nada me impedirá. 


Um tempo agora de lembrança ou quanto 
tempo dura um abraço, Alamedas Céu na Boca.
Uma  livre  apropriação do livro Perto do
coração selvagem de Clarice Lispector.
Brasília, maio de 2012 ou um tempo agora de (mu)dança. 



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